http://www.palavraeletrica.com/ Ao juntar poesia declamada, uma certa dose de bom humor, batidas eletrônicas, efeitos de dub, além das linhas de baixo que remetem ao funk e ao reggae temos como resultado a Palavra Elétrica do Freak Out Muzik: um coletivo de profissionais de áudio que não produz necessariamente o formato canção.
Sunday, November 26, 2006
LU AR
LU AR
Foi tudo programado. A gente sabia que cada passo dado seria histórico.Duca ria e me abraçava e andava lentamente como em camera lenta.Isto é história:íamos a pé para a casa da Vera, em Belo Horizonte, irmã de Lucinha, onde ela e Arnaldo Baptista se hospedam. Saímos assim que terminou o sound check da Orquestra Imperial.Compramos algumas cervejas e o trajeto foi tão longo que bebemos todas as latas." A gente bebeu, a gente fumou tanta coisa por aí..."
Tínhamos uma grana pro táxi e negociamos: Vamos comprar uma dúzia de latinhas e seguimos a pé. Não sabíamos o quanto era longe, acho que uns 3 km e acabamos com todas as cervejas...
Duca Moobwa, um cara branco,canabico, 20 e poucos anos, de classe média, gesticulava e falava muito rápido, balançava os braços exageradamente, feito Neal Cassady. Com tantas tatuagens e andar descolado de estradeiro, roadie, Duca, se parecia em qualquer lugar do planeta como um cara que tem uma banda de rock e ele tinha mesmo: Uma aparência inconfundível. E segredou, Cara, tenho um plano de jogar sem regras contra a sociedade, não sei fazer nada além de tocar guitarra e rock’n’roll....confesso que não entendi mas assenti, não iria medrar pelo silencio.
Quando acabaram as cervejas mas nao a sede, recordei um conto do Caio Fernando Abreu, do livro Morangos Mofados, em que o cara vai ao encontro do seu amor, e cai. Chovia muito e quebra a garrafa de conhaque e fica com vergonha de chegar com cheiro de álcool. Quando chega lá, ele bate, bate, bate na porta e... Como se chama o meu amor mesmo? Ele esquece o nome!!! É a cara das letras do Arnaldo, principalmente nas músicas que ele fez com a Patrulha do Espaço e Singing Alone, com seu palavrório assombroso, como se a sua integridade psíquica estivesse por desabar:
“...Hoje de amanhã eu acordei e pensei onde esta o arco íris?
Já não sei se voce é o arco íris
baby
Acordei sozinho e pensei: preciso de dinheiro
Já não sei se voce é o dinheiro
Será que baby sou eu?
Será q baby é vc?...Sera que Baby e Deus?
...É um pouco assustador, não é?...sexy,sexy sua, sexy sexy nos ouvidos...posso até me suicidar até o sol raiar...”
Lembrei da primeira audição do recente CD do Arnaldo, Let it Bed, na casa do Lobão, em que nos emocionamos, eu e Liege, ao ouvir " Bailarina", uma bossa jobiniana ( não uma dança fortuita), com letra e fatos experimentais caóticos que na lingua ‘arnaldês’ ficam tão simples, mesmo desconstruindo tudo:
me dá o prazer de ser mortal-imortal...
Fiquei extremamente feliz e pensei que isso não poderia ser um ato solitário, a minha felicidade tinha que ser compactuada , eu precisava dividir com todos e eu falava e falava das músicas e o cd saiu quase um ano depois. Me lembro de uma audição com os integrantes da banda Cachorro Grande e Lobão e o Fernando Sr. F em Brasília, todos extasiados com o cd.
Eu tinha vontade de perguntar para o Arnaldo sua orientação religiosa,fiquei curioso após ouvir L.S.D. em que ele diz, numa defesa profana: Louvado Seja Deus que nos deu o rock n´roll...Recentemente, Lucinha me disse que ele era ateu apesar de evocar tanto Deus nas suas músicas, “ se eu posso pensar que Deus sou eu e bruuuuuuuu....” em “ Balada do Louco”. Deus parecia seu objeto de obsessão, como se o Principio fundador, onipresente, também responsável pelo rocknroll, o cosmo virando caos de novo. A regravação dessa musica no Disco Voador potencializa com emoção exacerbada e angustiada, num disco com precários equipamentos técnicos em que o produtor Calanca escreveu em letras garrafais na contra-capa: Somente para Fãs. Arnaldo, perpetuamente brandindo sua procura, dando bandeira do pic-esconde entre Deus e ele. Ali, num impulso solitário mais uma vez ele grava sozinho todos os instrumentos. Lobão que recentemente gravou assim o cd “Canções Dentro da Noite Escura”, ao ser perguntado por um jornalista como era tocar todos os instrumentos, se não era solitário demais, ele disse, Mas um pintor também não faz seus quadros sozinho...?
Arnaldo fez um desenho pro Lobão, com as incriçoes: Lá Si Dó, sua eterna obsessão pela brincadeira, trocadilho, LSD. Sempre Deus e o acido lisérgico nas suas letras...só quem experimentou pode entender o seu recado. Deus e rock’n’roll. Deus e acido, complementares ou feroz antagonismo? Sua busca quixotesca por Deus? Ou deus?
JESUS... BACK TO THE WORLD....
Mais citacoes em Tacape: ‘por seu amor esqueço até de Deus...
Mas o papo fluía e não queria estar ali com papo inquisidor e afinal fomos lá para beber e matar as saudades.Nos falamos por e-mail quase diariamente há dois anos e eu sentia muitas saudades deles,me sentia feliz em ver os olhos de admiração e amor de Lucinha... a felicidade a fazia luminosa. “deve ser amor que estou sentindo, ´so pode ser amor que estou sentindo, yeah..”
Recomendei ao Duca pra não ficar esmiuçando o passado e tal, falando de Rita Lee....e assim que começamos a conversar eu disse que iria nascer minha primeira neta, Clara Peticov, e Arnaldo recordou que o Antonio Peticov, que foi também seu empresário, foi o cara que fez aquela famosa calça de couro que está na capa do Lóki? Daí falamos sobre o festival de São Lourenço, onde Lucinha disse te-lo conhececido e foi um pulo pra Rita: o André Peticov, avô da Clara! fez a capa do melhor disco de Rita, pré-Roberto de Carvalho: “ Atrás do porto tem uma cidade”....e não paramos mais de falar do passado...Então Arnaldo foi até o equipamento de som e trocou o disco do Queen pelo novo do Pato Fu e cantava todas as letras.
Depois de nos mostrar seus desenhos e camisetas, bebemos e fumamos e convencemos todos a irem ao show da Orquestra Imperial, após acabarmos todo seu estoque de cigarros e de cervejas.
Chegamos.
Foi mágico circular pelo salão onde todos queriam cumprimentar o cara. No camarim todos os músicos queriam vê-lo, conversar, acho que os mais novos nunca deviam te-lo visto. Arnaldo me perguntou quem era o Moreno, filho do Caetano veloso e os apresentei. Fiquei orgulhoso por estar em sua companhia, por conviver no mesmo espaço com um cara de sua dimensão histórica e musical, um verdadeiro outsider, sempre esteve a margem, desde O Seis, dos Mutantes e de sua carreira solo.
Pensei isso hoje: Os Mutantes não acabaram. Nesse exato momento em varias partes do mundo tem alguém ouvindo Mutantes, numa orgia perpétua. Só que Sérgio, Rita e Arnaldo não estão mais juntos, mas a sua musica esta tão presente com músicos diversos como Beck, Curt Cobain, Sean Lennon, David Byrne...
A revista inglesa Mojo os colocou em 12º lugar, numa lista dos “ 50 Most Out There Álbuns of All Time” ( os 50 discos mais experimentais de todos os tempos), ficando à frente de Pink Floyd, Beatles e Frank Zappa! Como bem descreveu o jornalista Will Hodgkinson, “ os Mutantes eram adolescentes brasileiros do LSD que descontruíram Beatles para reconstruí-los novamente..."
Recentemente a canção Minha Menina foi regravada pela banda britânica The Bees em seu primeiro disco, Sunshine Hit Me.
Nesse show que os Mutantes fizeram agora em Londres com os três originais, Arnaldo, Sergio e Dinho e Zélia Duncan nos vocais, a revista Time Out os chamou de “ a maior banda psicodélica de todos os tempos”.
Voltando ao Let It Bed: O cd foi aclamado em diversas partes mundo, por críticos e revistas especializadas de rock como o site Euro Club de Jazz pelo jornalista Bruce Gilman.
Ali, após anos sem gravar, mas experimentando sons em casa e estudando e lendo sobre física quântica, na minha opinião, Let it Bed é sua experiência de pico, seu nirvana musical. Um cd que funciona com um I Ching, que deveria ser vendido em farmácia, antídoto pré-depressisvo em que Arnaldo voa e coloca toda a sua linguagem peseudo-caotica (altamente subjetiva) sem freios. Nesse cd ele não fala português, ele apenas usa a língua como referencia, ele fala Arnaldês, uma língua pra iniciados, que se parece com o português mas não tem a amarras dessa língua. Língua, essa, que só quem ouviu Loki? Exaustivamente conhece e logo se identifica.
Voltando.
Levei alguns drinks pra eles que foram pra platéia superior assistir aos sambas psicodélicos da Orquestra. Numa dessas vezes em que voltei a Vera me disse que eles tinham ido embora. O Berna que é o maestro da Orquestra, havia acabado de convida-lo pra uma canja, fiquei pensando em como seria Lóki? tocado com tantos instrumentos...fica pra próxima!
Fica aqui registrado a força gravítica que a música do Arnaldo exerce sobre a minha vida desde os 13 anos e também, obviamente, o amor que sinto por ele e Lucinha.
Escrito ao som exaustivo, no maximo volume, do cd Let It Bed. Procure fazer o mesmo e viaje. ( Louvado Seja Deus!)
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3 comments:
Andre
que prazer ouvir tuas palavras...a gente pouco se conhece mas "muito nos conhcemos". Tava lembrando daquele dia que o PCC parou SP e eu te disse no meio de tantos drinks que queria uma revolta da sociedade musical q parasse a cidade, queria uma revolta tao surda e tao sagaz qto aquela que foi pra mal mas a ideia genial: parar a Paulista com musica e atitude, parar a Av Brasil como Duprat e Torquato Neto pararam...a vida eh doce, nos sabemos e vamos comendo pelas beiradas, irmao e amigo Insano!
abs
Blue Byra
Som Paulo!
MUITO BOM!!!!
me passa teu blog de novo
abs
Nossa!
Só li o primeiro, estou com pouco tempo agora, mas amei o seu jeito de escrever...
Vou virar sua fã!
Obrigada pelo convite!
Voltarei em breve!
Beijos
Fique com Deus!
(Zuzu Angel)
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