Saturday, May 06, 2023

HELPLES !

 

HELPLES (PARA SARA-1985).

Um amigo passou de onibus e me viu na Praça da República fazendo uma consulta de búzios com aqueles proto macumbeiros que ficam nas ruas. Morri de vergonha!
Eu andava consultando buzios,fazendo despacho com Gilberto, uma forte entidade que morava em Bangu, periferia do Rio de Janeiro.A minha depressão subira picos altíssimos pós separação- em 85, o ano do Rock In Rio- e eu vivia procurando ela por todos cantos, bradando que ela e Deus seriam a mesma pessoa e tudo nao passava de um golpe revanchista, punitivo da parte dos Dois. O sofrimento era indescritivel, nao comia direito,não conseguia mais dormir, perdi 8 kilos: a minha vontade sumiu!

               

Recreio (RJ), verão de 2001.


Ela possuía temperamento bélico e como se toda minha culpa, todos meus fracassos como homem e no relacionamento, se derivassem da herança deformada e perversa do meu passado. Ao mesmo tempo,ela alternava esse belicismo com atitudes zen, assim me deixando sem armas e argumentos. Hoje eu tenho capacidade de entender o que vivi com ela e perdi o bonde de ter aprendido toda sua generosidade e entrega com os filhos. Com os amigos na rua eu sabia como lidar,em casa,com a família,eu era um total fracasso, não tinha paciência e não entendia o universo das crianças, tratava elas como adultos e sem limites, tudo era permissivo. Estava no início daminha carreira internacional na turnê do Tom Jobim ao redor do mundo e tinha pouco convívio familiar.

Eu me sentia inocente de todos meus atos adúlteros, por viver em constante desordem moral, eu não me via e tampouco o outro. Era um monomaníaco com ideias fixas. Eu vivia constantemente as minhas fantasias e as vezes ia a tona,na superfície,pra fingir uma participação, mas estava sempre alheio ao outro.Falava sempre do que iria fazer e não o que tinha feito, na busca constante utópica de revolução em plena abertura de 85.Eu era um caos ‘bem sucedido.’O excesso de informações e viagens me privava do governo  de mim mesmo, eu me levava aos prazeres rápidos num total egoísmo.   

A sensação de estar excluído me aterrorizava, desde a infância eu tinha esse medo,mas o que me acalentava era que ninguém de verdade me conhecia, nem os mais próximos; e eu tinha facilidade de impressionar os outros, sempre com uma máscara, isso desde os 5 anos de idade, como descrevia Sartre, a crueldade das crianças.

Mas eu a amava demais e tinha que conciliar a minha vida como protagonista e personagem de mim mesmo, um desfile de excessos com a vida familiar. Como era difícil! E a minha tática de desarmar o adversário eram as palavras, tantas frases pra convencer a Sara  a voltar comigo,o que aconteceu 8 meses depois, conforme o jogador de búzios já consagrado como meu ‘guru’previu.

Anos depois me senti penalizado por termos continuado pois em 88 o abismo e o precipício se tornou realidade: eu estava em alta voltagem romântica com outra mulher e segui com as duas mas aí começa outra estória...

ELA & EU

 Março de 2020- Florianópolis ( Ano I Pandemia)

ELA & EU

“Para Ana Paula porque sabe de tudo e sempre me ouviu.”

Abro minha mochila de viagem após uma semana  e ainda estão  lá todos fetiches que não realizei, a  gravata pra te vendar, gel lubrificante , fitas halliman e tapes para amordaçar e te  imobilizar.Onde foi que eu errei? Quando pensei em fazer ou quando minha timidez  alcoólica me impediu ¿ um tremor no orgasmo um espasmo na masturbação conjunta e me pergunto aos 60 anos: quem é esse cara que habita em mim? Quando eu errei? Havia algo fora do lugar mas não sabia o que,me sentia totalmente desarmado.

Após horas num bar que demoramos muito pra chegar pois erramos o caminho e era perto do local do show e dava até pra ir `a pé  segundo um amigo, e tanto funk improvisado  por nós na van, no percurso aleatório, e tanta cerveja artesanal-os meus olhos e ouvidos  dispersos  eu não conseguia me concentrar, eu não queria, eu não precisava.Anos depois percebemos a importância desse dia pois foi nosso último show da turnê Planeta Fome, Elza Soares,  que rodou todo o Brasil e parte da América Latina...e uma semana depois o mundo desabou.

Como um ventríloquo, eu disse que a amava, era o que ela queria ouvir e eu realmente  falei  isso pra poucas mulheres....mas nada fugia `a sua atenção. E seus olhos me julgando numa falsa sobriedade parecendo uma promessa de uma possível DR póstuma numa narrativa de acontecimentos e falas desencontradas e descontinuadas que tentamos travar o dia todo mas eu  sentia que ela se empenhava pra me separar desses sentimentos românticos.

Quando o álcool já bem tarde a deixara segura num estado reflexivo, ela me olhou nos olhos e disse:

“ sei como voce é, te conheço há muitos anos, às vezes violento, perverso, previsível e muito amoroso mas com qual destes eu vou seguir esses dias, qual destes você nasceu e qual adquiriu¿ “ 

Eu ri  bêbado e respondi: ” com todos demônios que habitam em mim.”

Foi tudo corrido e eu me sentia liberto no fim da noite mas eu precisava observá-la me observando . E ela me olhava com aquele domínio exato do tempo que as mulheres têm , e seus olhos  encerravam uma promessa que saberia tudo sobre você se o olhase por muito tempo, por isso evitava seu olhar.

E eu já  não tinha pressa  além  de estudá-la...E seu rosto suave de menina, como  uma noite sem lua,é claro.

Quando chegamos na sua casa, na  sala eu senti tentado a beija-la e fazer sexo  no chão, impor minha língua `a dela, usar todas firulas da mochila   mas uma canção não saia da minha cabeça:

” tanta coisa eu tinha pra te dizer mas sua presença-um longo silêncio- calou minha voz e meus atos.” Eu estava tão imerso na febre que o alcool me propiciou ligaçoes excitáveis em todo meu corpo.

Então ela me olhou e foi como se ela me  visse pela primeira vez, seus olhos me percorrendo as palavras todas as palavras  precisavam ser ditas e eu não conseguia falar nada, tanta coisa eu tinha a dizer mas nosso  tempo era curto  e tão pouco e eu me preocupava que as  minhas palavras se tornassem rudes ou inapropriadas diante de sua nudez ( tanto álcool) ... mas ai eu saquei que não, era eu que a via  pela primeira vez desnuda em seu corpinho sem falar  e perplexa com meu desconforto e timidez e...era o meu  silêncio que  dava certeza da minha solidão!

The End 1:

 Pois quando seria nosso próximo encontro¿ eu tinha que absorver cada segundo e guardar na minha mochila. Nosso  tempo era pouco, sempre foi, você sabe! Um beijo com cheiro de alcool, nos vemos, a van buzina,sifo pra Porto Alegre!Bye, bye.

 The End 2:

 Na hora da despedida, a van na porta, eu te convidei: Vamos  pra Porto Alegre ¿ Show no Opiniao, vai ser uma festa!

E você  indecisa perguntou, e as minhas roupas, to sem nada...eu disse: pegamos roupas no camarim.

Seguimos no ônibus e dormimos no sofá que apelidei de sofá dylanesco, devido ao seu costume de tantas turnês de bus, ele só conseguia dormir em sofás....mas isso seria outra história.

Após o show do Opiniao  quase te convenci a seguir  pra São Paulo...se tivesse vindo, imagina,  o fim do mundo desabou aqui dia 14 de março e até hoje temos os estilhaços disso.

Voce e essa noite, a Caverna Bugio... são as únicas coisas de Florianopolis que ainda me pertencem. Depois desses dias  tao intensos  tive receio que não houvesse algo capaz de surpreender-me e o medo de que não me abandonasse a impressão de querer voltar no tempo. Mas...

 

“Se você quiser eu danço com você no pó da estrada.
Eu danço com você o que você dançar, se você quiser eu danço com você”

Ronaldo Bastos|Lô Borges.

 

 “Mesmo que queimes o juízo, não me pagarás num século essa revelação”

JL Borges

Alguns erros de português são propositais, assim como vírgulas, pontuações. Eu escrevo a prosa livre falada de Neal Cassady. (com amor, pra Ana.)

Wednesday, April 26, 2023

the dark side of the sun

 

the dark side of the sun/2019 ( Primavera  Blumenau)

 

Nessa última temporada que estávamos juntos, eu e a Lia ( primavera de  2019) eu comecei a me interessar pela rotação do sol, onde ele nascia e o seu trajeto circular ou rotacional que havia imaginado errado. 

Eu queria construir uma casa com energia solar e que o sol nascente me acordasse pela janela ou mesmo às vezes, quando eu  virava a noite ( sem dormir) que eu visse o sol no café da manhã.

(Sim, éramos casados mas passávamos temporadas eventuais juntos devido às nossas agendas, morávamos em avião e hotéis pelo mundo, em função de nossos trabalhos.)

Ela ria e achava que era perda de tempo ou talvez eu estivesse fazendo algum jogo pra impressioná-la, sim, eu ainda tentava seduzi-la de diversas maneiras e  às vezes me achava um colegial feito canção do Leoni :“Garotos I, II, III “ e por aí vai, “sempre me perguntando porque a vida não era como na Tv ou no cinema.”

Eu tinha um sonho de vê-la dançando, os braços levantados, as mãos  como os Djs fazem pra incitar o público...eu não confio em quem não bebe ou quem não dança:

 

Quantas oportunidades você perdeu por não saber dançar?

Quantas vezes você dançou por não saber perder?

 



Quando ela foi me conhecer em Florianópolis ficou horas fazendo a mala, se trocou várias vezes, eu sabia...se levasse muita roupa  seria porque iria passar muitos  dias comigo, se levasse pouca, jogo rápido. Ficou duas noites e recebeu uma ligação de Brasilia e saiu ás pressas (-“ te amei, seguimos juntos, não sou de ficar, vamos encarar nossas fronteiras”....)meses depois ela me confirmou isso... eu videnciei por sermos librianos e sei como nos comportamos em restaurantes, em situações que precisamos fazer escolhas, os cardápios a nossa frente como um desafio e timidez... esse dia  seria nosso primeiro encontro real após meses flertando na rede... nunca ficamos desde então nesses cinco anos, mais que 8 horas sem nos falarmos, apenas quando fui pra Europa e fui by-passado no outono passado mas isso será outro texto...uma familiar infelicidade havia se instalado em todo meu corpo e aí em Amsterdã após uma noite etílica e idílica eu liguei pra ela as 5h da manhã e defini a relação me pus a disposição:

­-sim, eu moro com você no sul e a guarda do João Gabriel era minha, finalmente, ele já tinha feito 10 anos  e poderia  escolher.

 E toda a minha a vida a dois até essa época, minhas relações sentimentais, tinha sido uma série de sucessos anulados por breves fracassos, eu tinha que lidar  com isso agora com maestria e maturidade, eu não era mais um Garotos 1 das canções do Leoni. Apesar de ter me casado várias vezes, eu me sentia inocente porque me mantive sempre amigo das ex-mulheres, e duplo libriano, sim, eu gostava muito de me casar e minha felicidade consiste em ser feliz a dois, daí minha incessante busca, até que conheci Lia em 2015  e...

 

by@luisaconde.

Voltando: quando nos conhecemos  ela estava em plena campanha política de um candidato a prefeito muito famoso e influente na sua cidade e teve que se hospedar no mesmo hotel que eu estava com o seu RG falso, Sra. Silva. Eu não fazia perguntas naquela  época, sentia-me particularmente desarmado, não conseguia digerir suas histórias mas precisava aceitá-las pois Lia estava em comunhão com tudo o que nos cercava, com tudo o que que eu queria. Eu sempre, o centro do universo... o meu instinto me aconselhava  isso, apenas deixava ela gravitar à minha volta enquanto eu contava estórias que não tinham fim e se emendavam em outras às vezes eu mesmo me perguntando se tudo o que eu falava era real devido a ter tantas versões que iam melhorando à medida que o tempo passava...acho que o tempo está passando a Mão em mim...o meu ego inflava e  eu via o meu sotaque da cidade que  deu meu imprinting (sou um Rio que jamais chega no mar) e pensava: ela deve estar me achando um ególatra dos infernos, mas o que fazer se 90% do que eu falava era real e o resto eu ...improvisava, e ela ria das sonoridades das palavras.

O meu medo e percepção da morte eram minhas molas motivadoras, e eu cada vez mais compreendia porque muitos dos meus amigos não suportavam ficar sós a noite e me ligavam pra não beber sozinho, a Nana Caymmi que me ensinou isso:" quem bebe só é alcoolatra, eu nao, eu telefono  pra voce..."

 Nos meus sonhos  Lia dançava com movimentos sexy com suas mãos tão pequenas  e fazia trejeitos de prazer com sua boca, tudo muito sutil, ao som de música latina.

Na realidade não, nunca dançava, apenas simulava quando ouvia uma música eletrônica sempre com a mesma mímica corporal, os braços erguidos....tudo tão sensual e leve como todo o seu movimento era...e eu nunca saberia o que é de verdade numa mulher interessante que jantava e ia pra capital do Brasil com senadores, políticos da alta esfera.

Eu a amava demais e morria de medo, e jamais fazia perguntas quanto a sua agenda e reuniões políticas e mal me importava se eram de direita ou esquerda. Eu a amava demais pra fazer perguntas.

Eu não me importava em saber quem era aquela mulher que apareceu em 2015 do nada vestindo aquelas roupas, apenas queria te-la e passar o máximo do meu Tempo com ela e ouvir suas histórias sobre os políticos da capital federal.

Tinha uma risada alta e histriônica e após o convívio esparso, teria sido perfeita, se eu já não desconfiasse e evidenciasse que seu arraigamento religioso e sua formação familiar falida de cidade sulista estavam vindo a tona, havia uma forte tensão em mim e uma exigência que ela fosse perfeita.

 

A força da gravidade:

Ela me perguntou se havia algo no passado que eu gostaria de mudar sobre meus múltiplos relacionamentos e eu como que adivinhando o que ela queria ouvir, disse: sim, tudo,gostaria de mudar tudo!

 

Quando eu perdi meu casamento com ela em 2019 eu  não tive chance de lutar porque eu não percebi in loco o que estava acontecendo no turbilhão que eu vivia de turnês de shows intermináveis ( a  Turnê A Mulher do Fim do Mundo rodou 1/3 do planeta) e a luta na justiça pela guarda de meu filho recente e Lia  no meio de tudo isso, perplexa, inclusa em algo que não foi consultada e exclusa do convívio diário do parco tempo que eu dispunha...vivia me cobrando uma casa no campo  estável e fim das turnês e eu apenas abanava a cabeça e dizia: tenho uma guarda compartilhada em São Paulo, um filho caçula de 6 anos.

E quando ela se foi, ficou sua lembrança em cada canto do apartamento em São Paulo, de todas as noites que dormi sem ela jurando pra mim que não ia telefonar pra ela e meu orgulho/jurava que não ia ligar até que fui pra  Argentina. 

 Antes de conhecê-la, quando eu saí daquele relacionamento em 2013,com a mãe do Joao Gabriel, na realidade quando eu entrei nesse relacionamento que eu tentava amar alguém que eu não amava e só precisava e queria que ela me salvasse de mim, e isso foi impossível...

quando eu saí dessa relação (em 2013) levei tudo, não deixei nada pra trás. Eu levaria até os pecados todos os erros, minha vergonha...se eu pudesse.

 

Lia  me ofereceu proteção, mas ela fazia parte do que eu deveria ser protegido.

 

"no final das contas, pode ser que nao sirva pra mais nada,

eu fui construido sobre uma ideia errada...segundo o qual as pessoas não são malvadas o suficiente para se perderem sozinhas, com seus próprios meios"

Paul Valéry. 

E aí 15 meses depois, 2021, Lia "nao me telefonou" ( foi um sonho querido) com sua voz embargada, nao identifiquei sua voz 

 

 

ACTION ONE

 ACTION ONE (piloto| atualizado todos dias) Outono  de 2019-  Pomerode ( SC)

“Nossos nadas pouco diferem, é trivial e fortuita a circunstância de que sejas tu o leitor destes exercícios, e eu seu redator”

JL Borges



No centro da sala, diante da mesa, Lia e sua mãe. Eu me sentia julgado, enquanto a mãe fingia mexer no celular, e não me ouvir, mas pra mim qualquer afetação de indignação ou negação teria me afetado menos que o desprezo silencioso, ou a calma falsa que precedia cada ação de sua filha. Paranoia. Eu andava obcecado e o meu peito parecia explodir. Lia havia assumido as funções de dirigente do legado familiar e de liderança política,com uma mão pesada!

Não, eu me controlo. Levanto e pego uma taça de vinho. As duas fingem não ver meus movimentos. Será que consigo descrever minhas sensações¿ A noite posta sobre a mesa. Estão fingindo olhar o celular e me julgando.

Não havia desdém nos seus silêncios, mas parecia que o verdadeiro sentido daquela conversa fosse nos levar à beira de uma catástrofe.

Lia era uma mulher com uma forte clarividência e já havia me adiantado algum desses fatos presentes, mas havia nela abstrações, e as vezes verdadeiras crueldades.

 Penso em sair da mesa alegando que vou fumar, mas elas sabem que não fumo, como sair disso agora¿ Paranoia. Eu não deveria por uma data pra essa estória pois é ́uma cena persecutória numa mesa de jantar com uma família que tento mais uma vez me adequar, mas eu começo a contar as histórias sobre a igreja e o Velho testamento... a algazarra crescente exponencial de minha cabeça em pânico atingia níveis...Paranoia. 

Eu vou levantar. Eu vou conseguir travar um diálogo. Vou sair pra fumar e nunca mais volto. Tudo isso rodava na minha cabeça como num filme. Me passa a salada. Ah, Alan Kardec, sim...Quis esclarecer esse delicado assunto,elas não me ouviam, sua mãe havia cuspido no nosso futuro!

Nessas horas penso em chamar Deus mas estamos de mal desde a segunda guerra quando Ele deixou tantos judeus morrerem covardemente! E também por que Ele não fez aquela bala parar em 8 dezembro de 80¿ Choro a  morte de Lennon todos dezembros. E eu precisava não soar arrogante o fato de  ter lido a bíblia aos 13 anos dezenas de vezes não me tornava um sábio,e como disse Espinosa, “fazer do conhecimento o mais potente dos afetos”.

Aí eu disse: " a Igreja é um agente do diabo!" Silencio.



De volta à mesa. O Amor por princípio, era somente isso que movia minhas ações nos últimos tempos mas eu estava obcecado, não vou negar. O princípio na busca do prazer, seria Impossível eu ver um futuro luminoso a partir de um presente nebuloso. E eu amava demais e havia me desprendido de todas relações duvidosas anteriores, total liberto.

Havia voltado a minha atividade de guerreiro, (Castanheda) a arte de espreita, de Caçador- já tinha até dois discípulos-versadíssimos em arte de feitiçaria branca-e pela manhã e no por do sol fazíamos exercícios pela rede e meditações e Passos do Poder em praias imaginárias. Essas ações e meu café da manhã regado a vinho artesanal era meu mundo, elas saiam pra trabalhar e eu pegava todos meus livros e espalhava sobre a mesa e começava o processo de criação...isso tudo me completava de maligna felicidade..eu tinha ciúmes da casa, ela na casa, como O Estorvo, do Chico Buarque. Me sentia no porão do Aleph, de Jorge Luis  Borges.

Parar o tempo. Exercícios na área da Vontade. Isso e a minha recente curiosidade de saber os pontos em que o sol nascia e se punha com  idéia de construir ali na região uma casa toda movida a energia solar.Ver o sol nascendo da minha mesa no ‘Alan’s psychodelic breakfast’ com vinho da região. Eu, eterno cosmopolita,rato de cidade, tentando me adequar à nova realidade.

Mas não, eu ainda estava no centro da sala, no jantar  e tinha ali, Deus, o Novo e o Velho Testamento e todas minhas dúvidas do Deus que havia nos abandonado na segunda guerra, segundo Dylan. E se eu acreditasse no que elas diziam, Lia e sua mãe, o mundo com certeza se tornaria um deserto de idéias.



by@Художник Дима Ребус

Eu precisava realmente sair desse lugar e um possível deslocamento da mesa no centro da sala, mas Lia  me puxava com seus grandes olhos verdes. Eu andava obcecado. E eu via nesse encontro, na mesa, nos olhos da Lia (que parecem um oceano), um demônio que rugia e um Deus que chorava,quis ser anjo e se tornou besta!

 E eu percebi que o incessante e vasto universo se afastava dela e esse desencaixe seria o primeiro de muitas mudanças e eu nao estava preparado pra seguir nessa coisa de antolhos, negacionismo, tudo o que o nosso país e o mundo se tornaria meses depois com a pandemia e um imbecil no poder. E eu pensava: Não me faça te desprezar, visto que te amar já era tão dificil!

Inveja hereditária e circular, mais uma vez uma sogra no meu caminho, e essa culpada e não-católica, protestante até a medula. Não confio em ninguém com mais de 30 anos que frequenta templos e principalmente se for protestante!

Era um deja-vu: autoritária e ineficiente

E quando eu comecei a emular as minhas opiniões, e me examinei no íntimo eu não tinha mais certeza de que não sentiria medo de me expor...eu já não sabia...mas num desespero de ternura eu tentava resgatar nossos sentimentos, nosso casamento com a morte anunciada e desejada por sua mãe, que não suportava nossa felicidade e nao conseguiu por um tempo de nos impedir de sermos felizes- com coisas tao simples, nossas viagens ao redor do planeta,algumas vezes em comum, noutras on line. Combinamos de nunca ficarmos mais de 8 horas sem nos falarmos.

 Motes:

 Vc não foi convidada ( ao som de Alanis Morissette)

Um principio de extase

Excede em dispensaveis analogias e em ociosas hesitações

Tinha em Lia uma afiliada                  

Como se chamam trabalho e solidão, apoiado nessas duas hastes

  

ACTION TWO.

(“Se em sua vida te incomodei, ao morrer, serei sua morte”)

 “pode falar sobre isso, falar sobre isso, mas não pode controlar seus destino. Acho que deus está me testando”

Saul Williams 

Saturday, April 22, 2023

lia me telefonou!

 São Paulo-verao de 2021.Ano II Pandemia.

Lia me telefonou.

 

Lia me acordou às 10h15. Eu acordo tarde e fiquei preocupado pois não nos falávamos há 15 meses, uma ruptura radical  com problemas familiares envolvidos. E eu...

 

E o nosso rompimento estava obscurecido pela violência de nossos sentimentos, assuntos pessoais não resolvidos e eu tinha que resolver ali no convivo toda minha utopia de louco, sonhador- era assim que eles me viam, sua família- e ela não merecia enfrentar aquela dor:



             “o que é de vidro quebra, por favor, não vá”





Eu disse pra Lia:

- os pecados dos seus pais te perseguem até que você decide dar fim a eles.

 

E ela não falava nada, eu apenas ouvia sua respiração,foi dificil compartilhar sua aflição, então Lia finalmente disse:

            -Posso apenas chorar no telefone?

 Eu disse que sim, obviamente. E foi isso, chorou alguns minutos e desligou.

 

Lia é dupla  canceriana e eu duplo libriano. Em 2013 foi amor ao primeiro scrap,nos conhecemos  pela rede e foi paixão fulminante. Ficamos alguns meses namorando pela rede até que certo dia fui trabalhar perto de sua cidade do interior e nos conhecemos em  Curitiba.

Lia era de formação campesina, neta de italianos, tinha forte educação e orientação católica. Era envolvida desde adolescente com partidos políticos de centro, amiga de políticos influentes, teve até um caso velado com um senador idoso quando esteve em Brasília aos 19 anos.

 

Ela pensava que ia me consertar mas as pessoas não consertam umas às outras...e nunca se tornam nada além do que sempre foram, mas eu a iludi durante um tempo sendo algo que eu não era. Sou de temperamento bélico e cosmopolita, até fico um tempo no campo mas o canto dos pássaros e o bater de asas de borboletas vão me irritando lentamente.

Aí ela me telefonou e eu sabia que isso ia acontecer em algum momento, mas não assim, ligar pra chorar no telefone sem falar uma palavra.E eu ainda a amava, apesar de não admitir pra mim mesmo.

 

Uma infelicidade familiar logo se instalou em mim, a essa altura havia uma contradição entre o meu ódio e o meu não  ódio por ter sido abandonado ou por me sentir assim.

Mas será que eu tinha sido abandonado ou eu provoquei tudo isso?

Num certo momento em que eu a amava muito ela me propôs ser livre pois percebeu que era muito difícil lidar com toda a questão familiar, eu me sentia deslocado.

 Eu tinha que medir as palavras na hora dos  jantares  em família mas eu não queria liberdade, queria o sacrifício de viver com ela apesar de tudo.

 

E eu ali ao seu lado, não via as coisas como são e sim como eu era. Eu não me sentia incluso e na verdade não fazia o menor esforço pra tal, vivia no meu mundo privado, lendo e bebendo e escrevendo.

 Eu tomava um café bem reforçado às 7h e às 11h já tomava o primeiro copo de vinho. E ela não gostava dos meus hábitos alcoólatras, mas eu não conseguia conviver com tudo aquilo tão sóbrio. E além de tudo, o meu ego, não me bastava eu burlar as regras na nossa união, eu tinha que criar as minhas próprias regras também. Era assustador pra ela.


                                                                       by@johandsonrezende


Eu era munido de frases, de ideias, imprevistos, como chaves de fenda pra produzir curto circuitos (como disse  Foucault) e produzir curto circuito na família, desqualificar e assim quebrar a onda de sistemas  de poder. Lógico que isso tudo desagradava profundamente sua mãe e seu irmão mais novo de 20 anos adorava e ficava extasiado com minhas colocações e tentativas de “tocar fogo no apartamento” no café da manhã.

 

E todo esse meu comportamento, escrever e beber   era pra dar vida, mostrar  a vida onde ela está sufocada,era pra traçar uma linha de fuga, promover o encontro que faria  ela pensar. Nos tirar da rotina. “ Tocar fogo no apartamento”

  

 Eu ainda a amava. Amor incondicional...tem um ponto que o amor acaba ou ele cresce exponencialmente ate o infinito e eu não podia amar mais além daquele ponto.E quando finalmente  voltei da turnê “Mulher do Fim do Mundo”  tinha percorrido quase toda a Europa, eu estava desarmado, um 38 sem balas,um coronel sem exercito,eu precisava me reeducar, o meu egocentrismo. Eu no centro da sala, diante da mesa com sua família. Eu gravitando a sua volta mas dissimulando o contrário. Eu a amava demais!

E sempre fui de temperamento bélico, as armas todas carregadas. Granadas de boca.

Espada nas mãos.

Virus letal no olhos.

Eu te amava demais! Te amo ainda ¿

 

São Paulo- Outono de 2022.

 

Ps: Não te desejo mais.E a sua ausência preenchendo minha vida por completo,como uma droga, e me destrói!

Paguei um preço alto por esses fracassos, mas minha escrita é tudo o que tenho.

E eu pensava que Deus havia criado você pra mim!!!

OUÇA A PALAVRA ELÉTRICA VOL.1